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Legalismo X Liberdade – Parte II: definindo legalismo

Por Sam Storms (veja primeira parte do artigo aqui)

O legalismo tem sido definido de diversas maneiras, mas aqui está a minha tentativa:

Legalismo é a tendência de considerar como lei divina coisas que Deus não exige nem proíbe nas Escrituras, e a inclinação correspondente a ver com maus olhos aqueles que não conseguem ou se recusam a conformar-se.

 

Então, como sei se sou um legalista? Aqui está um teste simples que consiste de cinco perguntas.

1. Você dá maior valor a costumes da igreja que a princípios bíblicos?

Muitos dos nossos supostos “certos” e “errados” na vida de igreja são um produto que não vem da Bíblia, mas de um pano de fundo de família, cultura, fatores sociais e econômicos, localização geográfica e um longo compromisso institucional de fazer as coisas da maneira como sempre foram feitas. Novamente, enquanto a Bíblia não condena certas práticas, você está livre para praticá-las. Mas você não está livre para insistir que outros o façam também.

2. Você coloca como lei moral algo que a Bíblia não exige?

Deixe-me mencionar alguns exemplos.

Se por um lado a Bíblia explicitamente proíbe a embriaguez, em nenhum lugar ela exige abstinência total. Não tenhas dúvidas: a abstinência total do álcool é ótima. Sendo cristão, você certamente tem a liberdade para adotar este estilo de vida. Mas você não está livre para condenar aqueles que escolhem beber em moderação. Você pode argumentar com eles a respeito da sabedoria de tal escolha e as conseqüências práticas dela, mas você não pode condená-las como espirituais inferiores ou abaixo do melhor de Deus.

A Bíblia incentiva a modéstia no vestir. Tanto homens quanto mulheres devem tomar cuidado para que se vistam de maneira que não ostente sua sexualidade ou que seja desnecessariamente vistosa e sedutora. Mas não temos o direito de condenar outros por usarem roupas coloridas ou maquiagem ou um penteado específico.

A Bíblia condena a luxúria, sem dúvida alguma. Mas o legalista usa isso para condenar tudo como profano, desde TV até a internet, até filmes com restrição etária (a partir de 12 anos), até homens e mulheres na piscina juntos. Não tenha dúvidas: você faria muito bem restringindo seu uso de TV e internet, e eu o encorajo fortemente a ter maior discernimento como nunca antes no que se refere ao lixo que vem de Hollywood que tão frequentemente é considerado “arte”. Mas essas formas de mídia também podem ser ferramentas poderosas na expansão e expressão de verdades do Reino, quando utilizadas com sabedoria.

A Bíblia ordena reuniões semanais para oração, estudo da Palavra, louvor e a celebração dos sacramentos. Mas o legalista condena como carnal qualquer pessoa que por qualquer razão perde um culto dominical ou ousa assistir um jogo de futebol à tarde ou opta por cortar a grama após o culto. Se você preferir não trabalhar aos domingos ou assistir eventos atléticos ou cuidar da casa, isso é ótimo. Mas não condene quem escolhe fazer diferente. Por que? Porque Deus não as condena.

É dever dos pais criar seus filhos nos caminhos do Senhor. Sobre isso não há dúvida. Como pai, você pode crer que toda escola pública é ferramenta do diabo e um antro de humanismo secular. Certamente é seu direito ter essa opinião e tomar suas decisões a respeito da educação do seu filho de acordo com isso. Mas você não tem direito bíblico nenhum de questionar a espiritualidade do pai cristão que pensa de maneira diferente. Se você educa seus filhos em casa ou os envia a uma escola particular ou pública é uma questão sobre a qual as Escrituras estão em silêncio. Tenha sua convicção com paixão e zelo, mas não tente escravizar a consciência daqueles que possam discordar de você.

3. Você tende a torcer seu nariz espiritual para aqueles que não seguem “a vontade de Deus para a sua vida”?

Chuck Swindoll conta a história de uma família missionária que servia num lugar onde era difícil comprar manteiga de amendoim. Esta família combinou com amigos dos EUA que enviassem manteiga de amendoim para lanchar, um costume comum entre americanos. Eles logo descobriram que outros missionários no mesmo país consideravam um sinal de espiritualidade abster-se de manteiga de amendoim. Era a “cruz que carregavam”! Essa família não ostentava o quanto gostavam de manteiga de amendoim, mas eles continuaram a agradecer a Deus por ela e curtiam seu lanche na privacidade do seu lar. Mas a pressão e a condenação dos colegas missionários se intensificou a tal ponto que a família eventualmente voltou para casa, desiludidos e cínicos.

Pode-se argumentar que o casal deveria ter se submetido e concordado em não comer manteiga de amendoim em consideração à crença dos seus colegas e pela causa do Evangelho naquele país. Possivelmente. Mas fazê-lo serviria apenas para reforçar o erro na mente dos legalistas que insistiam em dizer que a manteiga de amendoim era além dos limites. Você não faz favor a ninguém ao se comportar de uma maneira que incentive e encoraje seu caminho legalista.

Uma parte de ser cristão não é a liberdade de comer manteiga de amendoim. Mas não faz parte de ser cristão condenar o próximo se ele o faz. Você está livre para exercer a sua liberdade, mas você não está livre para insistir que outros não exercem a deles.

4. Você se sente incomodado pelo fato de que a Bíblia não fala explicitamente sobre toda decisão ética ou responde toda pergunta teológica?

O legalista tende a temer a ambiguidade. As cores prediletas do legalista são preto e branco. Eles se sentem incomodados pelo silêncio bíblico e insistem em falar quando a Palavra de Deus não o faz. Ele sente um tipo de “chamado” para preencher as lacunas deixadas pelo silêncio das Escrituras ou a fazer aplicações específicas e até detalhadas que Deus, na Bíblia, escolheu não fazer.

5. Você se sente mais confortável com regras que relacionamentos?

Não estou falando de regras bíblicas explícitas. No Salmo 119, vemos a resposta cristã apropriada às leis, ordenanças, os preceitos e regras bíblicas. Devemos nos regozijar e celebrar nas leis de Deus e, de maneira alegre e feliz, obedecê-las. Estou falando de regras próprias, regras que você se sente “levado” a fazer a partir do que você percebe ser a única aplicação legítima do que a Bíblia realmente diz. Regras dadas por Deus são boas e justas, mas elas são projetadas para melhorar e desenvolver relacionamentos cristãos, e não sufocar, esmagar e matá-los.

Na semana que vem, encerraremos nossa série. Falaremos sobre as razões por que alguém se torna legalista.

Texto extraído do blog de Sam Storms, pastor e teólogo norte-americano, autor de “Dons Espirituais: uma introdução bíblica, teológica e pastoral” e “Escolhidos: uma exposição da doutrina da eleição”, ambos lançados pela Editora Anno Domini, em 2014. A tradução do texto foi feita com a devida autorização do autor. 

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